Sendo o texto resultante de uma
organização em blocos de sentido, hierarquizados e relacionados entre si,
muitos são os operadores linguísticos que contribuem para a ligação entre esses
blocos.
Proliferam nos manuais
escolares e na nomenclatura usada pelos professores as mais diversas
designações desses operadores: conjunções, conectores frásicos, conectores
interfrásicos, conectores textuais, marcadores discursivos, marcadores
enunciativos, marcadores temporais, entre outros.
Não havendo uma ordem nestas
designações, aparentemente, todos teriam as mesmas propriedades e a mesma
função no texto e não é exatamente o caso.
Tanto o Dicionário
Terminológico como o texto “Gramática Textual do Português” de Maria Antónia
Coutinho, contribuem para caracterizar, relacionar e clarificar estas
designações.
Os conectores designam as
palavras ou expressões que servem para conectar (ligar, unir) vários segmentos
linguísticos: as frases de um período, os períodos no parágrafo e os parágrafos
no texto. Incluem-se neste grupo várias subclasses gramaticais de palavras:
conjunções (e; pois...); locuções conjuncionais (além disso; no entanto...);
advérbios (depois; finalmente...) ; locuções adverbiais (em seguida; por
último...); algumas orações não finitas ou com o verbo numa forma nominal –
gerúndio, infinitivo ou particípio – (concluindo; para terminar; feito isto).
A noção de conector prende-se
com a lógica dos predicados e a lógica das proposições, o que determina o valor
de verdade de uma proposição complexa, a partir dos valores de verdade ou de
falsidade das proposições simples conectadas, conforme indica Lyons (1997)
citado por Coutinho.
As conjunções, por exemplo,
pertencem a uma classe de palavras fechada e invariável, conforme se lê no
Dicionário Terminológico:
«Palavra invariável, pertencente a uma classe fechada de
palavras, que introduz orações e constituintes coordenados e orações subordinadas completivas e adverbiais». Assim, conjunções e conectores não são
termos sinónimos, pelo menos, se atentarmos no que indica o Dicionário Terminológico;
«[Conectores discursivos] São uma classe de marcadores discursivos, que ligam um enunciado a
outro enunciado ou uma sequência de enunciados a outra sequência, estabelecendo
uma relação semântica e pragmática entre os membros da cadeia discursiva, tanto
na sua realização oral como
na sua realização escrita.
Morfologicamente, são unidades linguísticas invariáveis, pertencem a
heterogéneas categorias gramaticais como interjeições, advérbios ou conjunções –, têm a mesma distribuição da classe de palavras a que pertencem e
contribuem de modo relevante para a coerência textual, orientando o recetor na
interpretação dos enunciados, na construção das inferências, no desenvolvimento
dos argumentos e dos contra-argumentos».
Como
exemplos, temos os conectores aditivos ou sumativos: além disso, ainda por cima, do mesmo modo, igualmente, etc; os conectores conclusivos e explicativos: por
consequência, logo, portanto, de modo que, donde se segue, etc; os conectores contrastivos ou
contra-argumentativos: sem embargo, não obstante, todavia, contudo, de qualquer
modo, em todo o caso, etc.
Segundo indicação do Ciberdúvidas de Língua Portuguesa, "os conectores constrastivos, não são considerados conjunções, mas apenas conectores de coordenação,
conforme designação proposta por Matos na última edição da Gramática Portuguesa de Mateus et al. (2003). Na verdade, não apresentam as mesmas propriedades que as conjunções e, por isso, a sua
categoria gramatical é reequacionada. Os conectores
contrastivos são, na
realidade, advérbios de valor contrastivo: porém, todavia, contudo, entretanto,
no entanto. Os conectores
conclusivos também não são
conjunções mas expressões
adverbiais ou preposicionais que
funcionam como adjuntos frásicos ou verbais com valor conclusivo. Sem mudarem
de classe gramatical, também os conectores
explicativos não são
conjunções, mas sim conectores de coordenação".
Podemos,
assim, dizer que as conjunções formam um subconjunto dos conetores e que são
estes últimos que se constituem como organizadores textuais, podendo abranger
operadores oriundos de outras classes gramaticais, designadamente os advérbios
e locuções adverbiais ou as locuções preposicionais, bem como frases e
segmentos de frase, orações
breves, expressões adverbiais ou conjuncionais (que formalmente podem coincidir
com o conector) as quais têm por função explicitar um dado tipo de articulação
entre estruturas semânticas complexas (coincidente algumas vezes com o
parágrafo, mas não obrigatoriamente) com o objetivo de construir o sentido de
um texto.
Exemplos
de Organizadores Textuais
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Assim...
Deste modo... No que a (x) diz respeito... Daqui decorre que... Não há dúvida de que... Acresce que... Soma-se a esta situação... A somar-se a esta situação está... Consequentemente... Inversamente... Simplesmente... Justamente... Vemos então que... Devemos notar que... Fica claro que... Noto que... Devo notar que... É de sublinhar... Sublinho que... Não posso deixar de referir... Em boa verdade... Consideremos que... Para além disso... Ora... |
Em contrapartida...
De facto... Na realidade... Em oposição... Ao contrário... Da conjunção destes fatores resulta que... Daqui decorre que... É certo que x é …. mas também não é menos verdade que… Enquanto que... Em contrapartida... Em todo o caso... Em virtude de... Um outro facto/ tipo/ elemento/, causa... Como referi acima... Por outras palavras... Dito de outro modo... Tal equivale a dizer que... Se virmos bem... Afinal... É fundamental perceber... Enquanto isso... Daí que... A verdade é que... |
Os organizadores acima não têm
todos o mesmo valor semântico: podem ser aditivos, contrastivos, conclusivos,
explicativos, de reformulação, de contra-argumentação, de enumeração, de
argumentação, etc. Vejamos, por exemplo, a categoria de organizadores enumerativos entre os quais se contam os aditivos e os marcadores
de integração linear. A diferença entre ambos reside no facto de os
aditivos não introduzirem qualquer princípio de ordem, limitando-se à função de
ligação sintática (e, ou, também, igualmente) enquanto os marcadores de integração linear asseguram a abertura, a
continuidade e o fecho de uma série, ao estabelecerem relações de ordem
hierárquica, espacial ou temporal. Utilizam-se também, para designar os mesmos,
o conceito de “marcadores / organizadores temporais e espaciais”: então, seguidamente, mais tarde,
finalmente; ao centro, ao lado, ao fundo, ao longe.
Os introdutores do universo do
discurso, a que ocasionalmente chamamos expressões introdutórias,
transcendem a mera introdução do que se vai dizer a seguir, uma vez que
constituem processos que configuram domínios, porções de texto condicionadas a
um determinado quadro, espaço ou interpretação conforme se lê no texto de Maria
Antónia Coutinho. Exemplos de introdutores de discurso são: “Segundo o autor…”,
“No século XX…”, “Em França…”, “Para os gregos…” ou ainda construções com
verbos de opinião.
Acrescente-se ainda a designação de marcadores de sequencialização proposta por diversos autores, baseada
na noção de sequência: esta corresponde a uma mudança de rumo do texto
claramente indicada pelo sujeito enunciador. Todos os conectores, em geral, são
marcadores de sequencialização mas alguns assumem um papel mais explícito na
marcação do princípio e fim de uma unidade: “Esta introdução…”, “Para
concluir…” e “Em resumo”.
Os conectores argumentativos são apresentados no texto de Coutinho
como “morfemas (do tipo conjunção de coordenação ou de subordinação, advérbio,
locução adverbial, etc) que articulam dois ou mais enunciados, envolvidos numa
mesma relação argumentativa”. Convém sublinhar que “argumentar” é diferente de
“provar”. Assim, existe relação argumentativa entre dois enunciados, quando um
deles é apresentado como destinado a fazer admitir ou justificar o outro. Um
será argumento, outro conclusão: “Acabei o trabalho ontem, portanto acabei-o
antes do prazo”.
Os argumentos
podem ter a função de causa, ou explicação, de justificação, de oposição e de
confirmação. Esta noção de que uma proposição contém argumentação sobre o que
se diz noutra com a qual está conectada é bastante elucidativa: por um lado,
ajuda a explicar aos alunos o tipo de ligação de sentido entre duas frases
subordinadas; por outro lado ajuda os alunos a reconhecerem e a produzirem
argumentos.
Em termos de
reflexão final sobre o tipo relações entre os conceitos abordados, parece-nos
que “conectores” é a designação que se aplica à ligação de proposições simples,
no microtexto, ao nível frásico, enquanto a noção de “organizadores textuais”
já se coloca ao nível de segmentos de texto de maior dimensão como o parágrafo
ou período.
Os organizadores
textuais também se configuram a partir de palavras das mesmas classes
gramaticais, porém, incluem outro tipo de expressões, sobretudo no caso dos
introdutores do universo do discurso.
Com a leitura
dos documentos citados, penso ter organizado mentalmente, a nível pessoal, um
conjunto de conceitos afins, cuja utilização difusa contribuía para produzir
confusão e dúvida no espírito dos alunos.
Bibliografia:
Coutinho, Maria
Antónia, “Gramática Textual”, FCSHL
Ana Isabel Falé
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