segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Conectores e Organizadores Textuais



Sendo o texto resultante de uma organização em blocos de sentido, hierarquizados e relacionados entre si, muitos são os operadores linguísticos que contribuem para a ligação entre esses blocos. 

Proliferam nos manuais escolares e na nomenclatura usada pelos professores as mais diversas designações desses operadores: conjunções, conectores frásicos, conectores interfrásicos,  conectores textuais, marcadores discursivos, marcadores enunciativos, marcadores temporais, entre outros.

Não havendo uma ordem nestas designações, aparentemente, todos teriam as mesmas propriedades e a mesma função no texto e não é exatamente o caso.

Tanto o Dicionário Terminológico como o texto “Gramática Textual do Português” de Maria Antónia Coutinho, contribuem para caracterizar, relacionar e clarificar estas designações.

Os conectores designam as palavras ou expressões que servem para conectar (ligar, unir) vários segmentos linguísticos: as frases de um período, os períodos no parágrafo e os parágrafos no texto. Incluem-se neste grupo várias subclasses gramaticais de palavras: conjunções (e; pois...); locuções conjuncionais (além disso; no entanto...); advérbios (depois; finalmente...) ; locuções adverbiais (em seguida; por último...); algumas orações não finitas ou com o verbo numa forma nominal – gerúndio, infinitivo ou particípio – (concluindo; para terminar; feito isto).

A noção de conector prende-se com a lógica dos predicados e a lógica das proposições, o que determina o valor de verdade de uma proposição complexa, a partir dos valores de verdade ou de falsidade das proposições simples conectadas, conforme indica Lyons (1997) citado por Coutinho.

As conjunções, por exemplo, pertencem a uma classe de palavras fechada e invariável, conforme se lê no Dicionário Terminológico:

«Palavra invariável, pertencente a uma classe fechada de palavras, que introduz orações e constituintes coordenados e orações subordinadas completivas e adverbiais». Assim, conjunções e conectores não são termos sinónimos, pelo menos, se atentarmos no que indica o Dicionário Terminológico

«[Conectores discursivos] São uma classe de marcadores discursivos, que ligam um enunciado a outro enunciado ou uma sequência de enunciados a outra sequência, estabelecendo uma relação semântica e pragmática entre os membros da cadeia discursiva, tanto na sua realização oral como na sua realização escrita. Morfologicamente, são unidades linguísticas invariáveis, pertencem a heterogéneas categorias gramaticais como interjeiçõesadvérbios ou conjunções –, têm a mesma distribuição da classe de palavras a que pertencem e contribuem de modo relevante para a coerência textual, orientando o recetor na interpretação dos enunciados, na construção das inferências, no desenvolvimento dos argumentos e dos contra-argumentos».

Como exemplos, temos os conectores aditivos ou sumativos: além disso, ainda por cima, do mesmo modo, igualmente, etc; os conectores conclusivos e explicativos: por consequência, logo, portanto, de modo que, donde se segue, etc;  os conectores contrastivos ou contra-argumentativos: sem embargo, não obstante, todavia, contudo, de qualquer modo, em todo o caso, etc.

Segundo indicação do Ciberdúvidas de Língua Portuguesa, "os conectores constrastivos, não são considerados conjunções, mas apenas conectores de coordenação, conforme designação proposta por Matos na última edição da Gramática Portuguesa de Mateus et al. (2003). Na verdade, não apresentam as mesmas propriedades que as conjunções e, por isso, a sua categoria gramatical é reequacionada. Os conectores contrastivos são, na realidade, advérbios de valor contrastivo: porém, todavia, contudo, entretanto, no entanto. Os conectores conclusivos também não são conjunções mas expressões adverbiais ou preposicionais que funcionam como adjuntos frásicos ou verbais com valor conclusivo. Sem mudarem de classe gramatical, também os conectores explicativos não são conjunções, mas sim conectores de coordenação".

Podemos, assim, dizer que as conjunções formam um subconjunto dos conetores e que são estes últimos que se constituem como organizadores textuais, podendo abranger operadores oriundos de outras classes gramaticais, designadamente os advérbios e locuções adverbiais ou as locuções preposicionais, bem como frases e segmentos de frase, orações breves, expressões adverbiais ou conjuncionais (que formalmente podem coincidir com o conector) as quais têm por função explicitar um dado tipo de articulação entre estruturas semânticas complexas (coincidente algumas vezes com o parágrafo, mas não obrigatoriamente) com o objetivo de construir o sentido de um texto.


Exemplos de Organizadores Textuais
Assim...
Deste modo...
No que a (x) diz respeito...
Daqui decorre que...
Não há dúvida de que...
Acresce que...
Soma-se a esta situação...
A somar-se a esta situação está...
Consequentemente...
Inversamente...
Simplesmente...
Justamente...
Vemos então que...
Devemos notar que...
Fica claro que...
Noto que...
Devo notar que...
É de sublinhar...
Sublinho que...
Não posso deixar de referir...
Em boa verdade...
Consideremos que...
Para além disso...
Ora...
Em contrapartida...
De facto...
Na realidade...
Em oposição...
Ao contrário...
Da conjunção destes fatores resulta que...
Daqui decorre que...
É certo que x é …. mas também não é menos verdade que…
Enquanto que...
Em contrapartida...
Em todo o caso...
Em virtude de...
Um outro facto/ tipo/ elemento/, causa...
Como referi acima...
Por outras palavras...
Dito de outro modo...
Tal equivale a dizer que...
Se virmos bem...
Afinal...
É fundamental perceber...
Enquanto isso...
Daí que...
A verdade é que...


Os organizadores acima não têm todos o mesmo valor semântico: podem ser aditivos, contrastivos, conclusivos, explicativos, de reformulação, de contra-argumentação, de enumeração, de argumentação, etc. Vejamos, por exemplo, a categoria de organizadores enumerativos entre os quais se contam os aditivos e os marcadores de integração linear. A diferença entre ambos reside no facto de os aditivos não introduzirem qualquer princípio de ordem, limitando-se à função de ligação sintática (e, ou, também, igualmente) enquanto os marcadores de integração linear asseguram a abertura, a continuidade e o fecho de uma série, ao estabelecerem relações de ordem hierárquica, espacial ou temporal. Utilizam-se também, para designar os mesmos, o conceito de “marcadores / organizadores temporais e espaciais”: então, seguidamente, mais tarde, finalmente; ao centro, ao lado, ao fundo, ao longe.

Os introdutores do universo do discurso, a que ocasionalmente chamamos expressões introdutórias,  transcendem a mera introdução do que se vai dizer a seguir, uma vez que constituem processos que configuram domínios, porções de texto condicionadas a um determinado quadro, espaço ou interpretação conforme se lê no texto de Maria Antónia Coutinho. Exemplos de introdutores de discurso são: “Segundo o autor…”, “No século XX…”, “Em França…”, “Para os gregos…” ou ainda construções com verbos de opinião.

Acrescente-se ainda a designação de marcadores de sequencialização proposta por diversos autores, baseada na noção de sequência: esta corresponde a uma mudança de rumo do texto claramente indicada pelo sujeito enunciador. Todos os conectores, em geral, são marcadores de sequencialização mas alguns assumem um papel mais explícito na marcação do princípio e fim de uma unidade: “Esta introdução…”, “Para concluir…” e “Em resumo”.

Os conectores argumentativos são apresentados no texto de Coutinho como “morfemas (do tipo conjunção de coordenação ou de subordinação, advérbio, locução adverbial, etc) que articulam dois ou mais enunciados, envolvidos numa mesma relação argumentativa”. Convém sublinhar que “argumentar” é diferente de “provar”. Assim, existe relação argumentativa entre dois enunciados, quando um deles é apresentado como destinado a fazer admitir ou justificar o outro. Um será argumento, outro conclusão: “Acabei o trabalho ontem, portanto acabei-o antes do prazo”.

Os argumentos podem ter a função de causa, ou explicação, de justificação, de oposição e de confirmação. Esta noção de que uma proposição contém argumentação sobre o que se diz noutra com a qual está conectada é bastante elucidativa: por um lado, ajuda a explicar aos alunos o tipo de ligação de sentido entre duas frases subordinadas; por outro lado ajuda os alunos a reconhecerem e a produzirem argumentos.

Em termos de reflexão final sobre o tipo relações entre os conceitos abordados, parece-nos que “conectores” é a designação que se aplica à ligação de proposições simples, no microtexto, ao nível frásico, enquanto a noção de “organizadores textuais” já se coloca ao nível de segmentos de texto de maior dimensão como o parágrafo ou período.

Os organizadores textuais também se configuram a partir de palavras das mesmas classes gramaticais, porém, incluem outro tipo de expressões, sobretudo no caso dos introdutores do universo do discurso.

Com a leitura dos documentos citados, penso ter organizado mentalmente, a nível pessoal, um conjunto de conceitos afins, cuja utilização difusa contribuía para produzir confusão e dúvida no espírito dos alunos.


Bibliografia:

Coutinho, Maria Antónia, “Gramática Textual”, FCSHL

Dicionário Terminológico, DGEST 
Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

                                                                                      
                                                                                                                      Ana Isabel Falé

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